De acordo com a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil 2016, 29% dos leitores na faixa dos 14 aos 17 anos tem o gosto pela leitura como principal motivação para ler. O número é ainda mais expressivo entre os leitores que têm entre 11 a 13 anos: 42% leem por vontade própria. O que isso representa?
É comum associar aos jovens o estigma de leitores desinteressados. Ao mesmo tempo, muitos autores afirmam que o gosto pela leitura se desenvolve nos anos iniciais de escolaridade, devendo ser estimulada de um lado pela família e, do outro, pela escola, utilizando-se de práticas críticas e reflexivas. Para a pesquisadora Ilda Moreira:
…não importa recorrer a métodos inovadores, se estes não forem bem explorados e aplicados de forma correta, em contexto de sala de aula, pelo professor.
Portanto, vemos que o incentivo à leitura e à formação de leitores é, antes de tudo, um trabalho lúdico e criativo.
Cabe ao professor e à escola oferecer aos alunos meios de, utilizando-se da leitura, compreender a si mesmo, ao mundo e aos limites de seu próprio discurso, bem como os de outrem. O professor é o principal mediador desse espaço de formação, lançando desafios e valorizando a jornada dos estudantes. É a tarefa de “ensinar a pensar certo” de que falava Paulo Freire.
Embora a leitura dos clássicos seja importante e necessária, enquanto ferramenta de conteúdo histórico e crítico, é preciso também respeitar o espaço de interesse dos jovens leitores. A literatura deve funcionar para ampliar seu repertório, mas também para apresentá-lo à atualidade e ao cotidiano.
Mas afinal, o que isso significa? Que para além dos clássicos e dos livros que são comumente apresentados em sala de aula, o professor deve estar atento ao que os jovens leem espontaneamente. A literatura infanto-juvenil nacional, que tem como principais ícones autores como Thalita Rebouças e Jim Anotsu, além dos livros comercialmente nomeados Young Adults (Jovens Adultos) , a exemplo de Jogos Vorazes e O Ódio que Você Semeia — ou mesmo o clássico Harry Potter — atraem os jovens leitores por ter em comum temas que são ao mesmo tempo atuais, como a violência urbana e o impacto da tecnologia nas relações humanas, universais, como a importância da amizade e do trabalho em equipe — e mesmo assuntos mais indigestos, como intolerância e racismo.
Arnaldo Niskier, em seu texto Os jovens e a leitura, ressalta:
A leitura faz parte do cotidiano, mas é na educação formal que devem ser exercitadas as práticas, de maneira organizada. A utilização de textos que circulam nas ruas e em casa constitui uma opção preciosa no dia-a-dia escolar em todos os níveis de ensino. Na verdade, o exercício de ler é multifacetado, eclético. Importante que atenda às exigências do grupo que o executa. Quanto ao professor, o que esperamos é que seja, antes de tudo, um leitor.
Reconhecer a realidade do aluno, absorvê-la e aplicá-la como ferramenta didática é o grande papel do professor quando falamos do estímulo à leitura. Exige do docente uma posição que é ao mesmo tempo de empatia — compreender os temas que incitam à leitura espontânea do aluno — e de equilibrista — visto que é necessário, ao mesmo tempo, apresentar ao jovem a literatura clássica.
E por que demandar esse esforço? Para munir a juventude de repertório cultural amplo, auxiliando-a a compreender seu espaço no mundo, a realidade em que se insere e os aspectos culturais e sociais que moldam esta realidade. Esse repertório cultural — ou, mais granularmente, esse repertório literário — funcionará como trampolim pra o desenvolvimento integral do aluno. Já falamos por aqui sobre a importância de formar indivíduos autônomos, instigando sua curiosidade e criticidade.
Eis o pulo do gato quando digo que o professor deve estar atento ao que seus alunos consomem espontaneamente: é nesse espaço inicial, confortável para o estudante, que serão plantadas as primeiras sementes de um pensamento literário crítico. Passando do conflito menos complexo para o mais complexo, dos personagens mais simples aos melhor lapidados, construímos um sentimento de proximidade com a literatura. Utilizamos o que é natural ao jovem para aproximá-lo dos livros, em lugar de bombardeá-lo com uma complexidade literária da qual ele pode ainda não ser íntimo. Precisamos abandonar nossos próprios preconceitos literários e nos preparar para formar sujeitos críticos, que encontrem nos livros e na leitura um recurso eficiente para solucionar conflitos.